Basta citar essas duas palavras em uma mesma frase, que logo recordo de uma professora na pós-graduação dizendo:
“O compliance e a governança corporativa andam juntas”.
Vou pedir para você guardar essa definição, pois mais para frente fará sentido.
Pelo início do texto, você, leitor, já deve ter percebido a adoção de um tom menos formal, o que pode causar desconforto nos meus colegas da área jurídica, desde já peço desculpas, mas o faço de forma intencional.
A maioria dos textos relacionados à área de governança corporativa e compliance busca condensar os conceitos e as vantagens desses institutos que, apesar de relativamente antigos, se tornaram populares no Brasil após as grandes operações anticorrupção, dentre as quais, destaca-se a Lava-jato, mas, na minha percepção, eles normalmente se direcionam para pessoas que são da própria área ou que tenham noção sobre o assunto, e vão muito além do risco de cair em uma investigação sobre lavagem de dinheiro.
Portanto, a proposta desse texto é diferente, e visa atingir aquele empresário que na busca de investimentos ou parceiros de negócios, ficou sabendo de um tal de compliance e governança corporativa em decorrência de exigências contratuais, e não através de formação ou pesquisa acadêmica.
Garanto para você empresário, apesar do processo de implantação ser complexo (várias etapas), entender ele não é um bicho de sete cabeças.
A escolha de começar a falar sobre um ou outro é difícil, porque é a mesma discussão de quem veio antes, o ovo ou a galinha, portanto por didática começo pela governança corporativa.
A governança corporativa diz respeito a identificar o conjunto de valores, regras e condutas que direcionam determinada empresa e, consequentemente, identificar o processo de tomada de decisões relativas aos rumos que a empresa tomará.
Por outro lado, o compliance diz respeito estar em conformidade com a legislação aplicável às atividades da empresa, mas, mais do que isso, é utilizar do processo de tomada de decisões com uma perspectiva preventiva (evitar irregularidades e danos à outras pessoas e organizações), e sob a perspectiva de geração de valor à sociedade (com aplicação de políticas socioeducacionais, culturais e ambientais, que transformem a empresa em uma agente de mudanças).
Para fugir da subjetividade desses conceitos, há um exemplo de empresa que merece ser citada por lidar com algo que os brasileiros amam, café, se propondo a fazer isso de forma diferente.
Por acaso você já ouviu falar na Kept Sustainable Coffee?
Apesar do nome estrangeiro, é uma empresa brasileira, fundada em 2021, com sede em Belo Horizonte, Minas Gerais, que se propôs a produzir e comercializar café de uma maneira diferente, qual seja, valorizando os cafeicultores, os tratando não como fornecedores, mas como parceiros de negócios, com o intuito de construir uma rede sustentável de produção.
Claramente, o processo de tomada de decisão dessa empresa é voltado para sustentabilidade da cadeia de produção, sendo que é o objetivo central sinalizado em suas próprias redes sociais, “valores não podem flutuar com o preço do café”[1], e por outro lado, sua forma de agir, além de respeitar as legislações aplicáveis, tal como trabalhista e ambiental, sugere ações proativas que geram impactos positivos à sociedade e ao meio ambiente.
O exemplo citado permite visualizar tanto a governança corporativa, representada na forma que a empresa toma suas decisões, quanto o compliance, representado no respeito às leis aplicáveis, somada às ações proativas.
Mas, afinal, qual a importância da governança corporativa e do compliance para os empresários que estão começando a se familiarizar com esses conceitos?
Existe o lado social, com o fato das empresas que adotam políticas de governança corporativa e compliance estarem mais próximos dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, firmados pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2015, tal como trabalho decente e crescimento econômico e a fome zero e agricultura sustentável, porém existe o lado capitalista, a mitigação de riscos e a projeção da imagem institucional da empresa aos consumidores.
Acredito que o lado social é muito relevante, porém quero concentrar no outro aspecto que parece mais próximo dos empresários brasileiros.
A partir do momento que os países se reuniram e traçaram as metas globais, é uma tendência natural que as leis e regulamentos relativos à proteção e atingimento desses objetivos se tornem mais rigorosas, e essa postura impacta nas atividades dos empresários que, além da busca de receita, objetivam reduzir seus custos e despesas.
E aqui entram a governança corporativa e o compliance, as empresas que estão aplicam tais políticas evitam, reduzem ou cortam riscos relativos à processos e multas, de modo que não sejam pegos de surpresa por uma autuação, seja ela fiscal, ambiental, trabalhista ou criminal.
E, da mesma forma, que a mitigação de riscos afeta na redução de passivos, gera repercussão perante os consumidores que, cada vez mais, exigem das empresas que adquirem produtos e/ou serviços alinhamento com as práticas de desenvolvimento sustentável, sendo que entre uma ou outra, a tendência é que seja privilegiada aquela mais alinhada aos seus valores pessoais.
Tal perspectiva chega ao ponto de mesmo uma empresa se utilizando de um valor médio mais alto para seus produtos, ter maior saída, em decorrência da identificação com o mercado consumidor.
Assim, vislumbra-se que apesar desses conceitos terem a possibilidade de soarem estranhos para alguns empresários, estão de forma crescente a fazerem parte do ambiente de negócios, tanto que, em determinadas parcerias público-privadas, a adoção da governança e do compliance já não se trata de uma escolha, mas um requisito indispensável, a partir dessa perspectiva não é aconselhável que o empresário busque adotar essas políticas da noite para o dia, mas que, gradativamente, busque mais informações, entenda seus processos de tomadas de decisões e realize o mapeamento de seus principais riscos, o que poderá vir ser um diferencial competitivo.
[1] https://keptcoffee.com.br/pages/nossa-causa